Em Bento Gonçalves, o tema do momento não é apenas a crise econômica ou a incerteza política nacional. O assunto que invade as rodas de conversa, os grupos de WhatsApp e a mesa do almoço de domingo é o valor da conta de energia elétrica da RGE. Faturas que até poucos meses atrás giravam entre R$ 150 e R$ 180 passaram a registrar cifras próximas ou superiores a R$ 800.
Não se trata de casos isolados: o Procon do município recebeu 37 reclamações apenas até a última sexta-feira. E, como costuma ocorrer no Brasil, esse número oficial é apenas a ponta de um iceberg de indignação, pois muitos consumidores desistem de formalizar denúncias diante da lentidão das respostas.
Diante desse quadro, o que impressiona não é só a cobrança abusiva, mas o silêncio das autoridades locais. Prefeito e vereadores de Bento Gonçalves parecem ter terceirizado ao cidadão a tarefa de enfrentar uma concessionária de energia elétrica com poder quase monopolista.
É sintomático comparar essa omissão ao comportamento dos mesmos parlamentares diante da Corsan. Lá, houve mobilização: reuniões, notas oficiais, cobranças públicas à Superintendência. Por que não se repete o gesto agora, quando a insatisfação é igualmente ruidosa e os prejuízos igualmente concretos?
Em Caxias do Sul, o Legislativo já deu demonstrações de como enfrentar uma concessionária: convocou representantes, exigiu explicações em plenário e expôs à sociedade os bastidores de uma relação sempre assimétrica entre consumidores e empresas de serviços essenciais. A pressão política não resolve tudo, mas cria constrangimentos e força respostas.
Em Bento, falta essa disposição. A passividade de quem deveria intermediar o diálogo escancara a distância entre o poder público e a vida real de seus eleitores.
Não é preciso reinventar a roda. O prefeito poderia convocar uma audiência pública urgente, com transmissão aberta e participação popular, para ouvir representantes da RGE. Vereadores poderiam articular uma frente parlamentar regional, somando forças com municípios vizinhos. O Procon, por sua vez, deveria trabalhar de forma integrada ao Legislativo, produzindo relatórios e oferecendo base técnica para a pressão política.
Há ainda espaço para soluções mais ousadas: criação de canais coletivos de contestação jurídica, que permitam ao consumidor não enfrentar sozinho a burocracia; pressão direta junto à Aneel, que tem poder regulador; e, sobretudo, dar visibilidade ao problema, transformando-o em prioridade política.
No fim, quem sofre é o cidadão comum, que não tem como escolher de quem compra energia e que, diante de aumentos inexplicáveis, vê-se obrigado a cortar gastos em outras áreas para pagar a fatura. É uma situação de abuso institucionalizado, em que o monopólio da concessionária se soma à inércia do poder público.
Não se trata de populismo ou de criar inimigos fáceis. Mas de compreender que energia elétrica, assim como água, é serviço essencial, e seu preço não pode variar sem justificativa plausível. Defender o consumidor nesse caso não é favor, é dever republicano.
Se os vereadores e o prefeito de Bento não entenderem isso, a população certamente cobrará nas urnas. Porque, entre a conta de luz e a conta política, não há dúvida de qual pesa mais.