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Boxe olímpico: muito mais que um esporte, um transformador de vidas

Academia Mano Boxe oportuniza crianças, jovens e adultos a praticar a modalidade e os valores que nela estão inseridos, visando a formação de cidadãos e a transformação social.

30/08/2021 às 14h58 Atualizada em 23/09/2021 às 23h49
Por: Kevin Sganzerla Fonte: NB Notícias
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Foto: Kévin Sganzerla
Foto: Kévin Sganzerla

Foco, determinação e coragem: essas palavras agora se fazem muito presentes no vocabulário de Alisson de Carli, de 31 anos. Com um passado envolvido com drogas, ele chegou a morar nas ruas e também entrou no mundo do crime, sendo preso. Hoje, sob liberdade condicional, Alisson encontrou no boxe uma saída para se destituir da criminalidade e direcionar os seus esforços em um grande objetivo nos ringues: se tornar um campeão. 

Ele é um dos exemplos de como o esporte pode se tornar um transformador de vidas. O boxe não só se destaca nas Olimpíadas, com três medalhistas brasileiros nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, como também proporciona uma oportunidade às crianças, jovens e adultos conhecerem e compartilharem valores que a modalidade ensina, desde o respeito, a coragem e a determinação. E é justamente esse o trabalho ofertado pela Academia Mano Boxe, em Bento Gonçalves. 

Por meio da Mano Boxe, Alisson se agarrou em sua coragem para mudar de vida e deixar de lado o passado para focar em seu sonho para o futuro. “Houve fatos que mudaram a minha vida. Fui ex-presidiário, um ex-viciado em drogas e acabei sendo morador de rua também. Mas o Mano me mostrou que eu podia fazer algo maravilhoso aqui no boxe e também me disse que eu podia mudar a minha vida, não só em cima dos ringues, mas também fora deles, eu podia me tornar uma pessoa melhor, com disciplina”, relata Alisson. 

Alisson também auxilia os demais atletas que praticam boxe compartilhando conhecimentos e técnicas / Foto: Kévin Sganzerla

Hoje, o atleta bento-gonçalvense, cuja paixão pelo boxe vem desde criança, quando assistia lutas do famoso pugilista Mike Tyson, se diz transformado pelo esporte. “Dia após dia o boxe vem transformando cada vez mais a minha vida. Hoje não uso mais drogas, estou em liberdade da prisão, não pratico mais o que praticava antes. Vivo do suor do meu trabalho e dia após dia quero cada vez mais evoluir no boxe e como pessoa também, sendo um cidadão cada vez melhor, com disciplina, com foco, sendo verdadeiro a todos os momentos”, pondera. 

É através dos valores do boxe que a academia Mano, que tem 15 anos de trajetória em Bento Gonçalves, busca promover a transformação social na sociedade e desenvolver futuros atletas na modalidade. “O boxe não só é importante como uma defesa pessoal como também trabalha com a mente e o corpo de qualquer pessoa. Temos esse trabalho de poder resgatar jovens, adolescentes, adultos do caminho da droga, do álcool, do roubo, enfim, tudo que vem a prejudicá-lo”, pondera Carlos Eduardo Leitão, o Mano, treinador e proprietário da Mano Boxe. 

Hoje, a academia conta com jovens e adultos que atuam em competições oficiais no Estado. Porém, além do foco na formação de pugilistas, a Mano tem como objetivo maior promover a inclusão e a transformação social através da modalidade. “Nosso trabalho quer fazer com que cada um venha a se sentir valorizado e que consiga reconhecer que há maneiras de transformar a vida através do esporte, de se recuperar e voltar perante à sociedade como um bom cidadão”, explica.

Treinador Mano tem pouco mais de 23 anos de trajetória na modalidade / Foto: Kévin Sganzerla

Mais que uma paixão, uma filosofia de vida:

O bento-gonçalvense Carlos Eduardo Leitão, conhecido popularmente como Mano, tem cerca de 23 anos inserido no boxe. Aos seis anos, ele praticava outra modalidade de contato, até descobrir o boxe, no qual se destacou a nível estadual e nacional. O atual treinador da Mano ficou quatro defendendo o seu título estadual e, concomitantemente a esse período, foi convocado pela Seleção Brasileira. Além disso, disputou diversos Circuitos Olímpicos. 

Após uma longa trajetória como atleta, Mano não deixou os ringues de lado, pelo contrário. As suas conquistas e o reconhecimento conquistado pela Confederação Brasileira de Boxe e Federação Gaúcha de Boxe o credenciaram a se tornar um dos treinadores da modalidade no Rio Grande do Sul, mais precisamente na Serra Gaúcha. 

Hoje, a academia Mano Boxe é uma das únicas a fomentar a modalidade na região. “Foi difícil entrar nesse novo ciclo. Tive que passar por todo um trabalho de aprendizagem para conhecer toda a área técnica na formação de atletas, no trabalho com o público, com crianças, com pessoas de mais idade. Tive que aprender em um longo período para poder hoje estar aqui com a escola Mano Boxe”, relata. 

Durante sua trajetória como atleta e, sobretudo, como treinador, Mano teve a oportunidade de conhecer e conviver com grandes atletas da modalidade no Brasil. Dentre eles, os medalhistas olímpicos de Tóquio 2020 Beatriz Ferreira e Abner Teixeira, além de outros pugilistas que fizeram história em Olimpíadas como Robson Conceição, considerado um dos maiores atletas da modalidade no país, o qual foi ouro na Rio 2016, e Adriana Araújo, bronze em Londres 2012. 

Mano ao lado de Beatriz Ferreira, Abner Teixeira e Robson Conceição /Fotos: Carlos Leitão/Divulgação

A paixão pelo boxe o motivou a dedicar e constituir sua vida por meio da modalidade, difundindo-a e com o objetivo de formar futuros lutadores. Quando começou a montar a escola Mano Boxe, mesmo não a divulgando, apareceram jovens interessados em praticar a modalidade, os quais acabaram ajudando nas reformas. “Quando percebi, começou a vir alunos, atletas, sem fazer nenhum convite. Depois de dois anos localizados neste local começamos a fazer a divulgação da academia, a única e permanente de boxe olímpico na nossa cidade. As portas se abriram e surgiram pessoas e alunos para serem formados como atletas e continuamos de braços abertos para receber todos da nossa cidade que querem conhecer o boxe, ou que almeja ser um atleta”, salienta. 

Formação de alunos visando o boxe profissional

Assim como Alisson, o boxe mudou a vida e a personalidade de inúmeros garotos que hoje compõem o grupo de atletas da Mano Boxe que competem a nível estadual. Lourenço Franzoni, de 15 anos, iniciou no boxe com seis a sete anos de idade. Na escola, se mostrava uma criança muito agressiva: “Eu era um garoto bem raivoso, gostava de bater em todo mundo. E meu pai me levou na escola de boxe, pois poderia ser uma ajuda para mim, para tirar essa raiva”, relata. 

O boxe mudou por completo a personalidade agressiva de Lourenço, que agora almeja se tornar um pugilista profissional / Foto: Kévin Sganzerla

E foi paixão à primeira vista. Quando iniciou, o jovem atleta incluiu o boxe em sua rotina. “Vim para uma aula experimental aqui e comecei já gostando. A adrenalina subia, gostava muito e virou uma paixão para mim, porque eu nunca tinha praticado e quando eu comecei eu já amei direto o esporte”, explica Lourenço. 

Através dos valores que a modalidade lhe trouxe para a sua vida, o promissor boxeador, que teve sua personalidade transformada por meio do boxe, agora foca no sonho de se tornar um pugilista profissional. “Sonho em ser um pugilista e talvez seguir carreira nacional e até mundial. E disputar uma Olimpíada com certeza é o meu sonho. Quero treinar e treinar até eu cair no chão. Quero treinar, pois desejo me sentir a pessoa mais no alto, no ‘pico do auge’ na modalidade”, reitera o jovem atleta bento-gonçalvense. 

Ele é uma das diversas promessas que estão sendo formadas na academia. De acordo com Mano, já são cinco anos de trabalho desempenhado na formação desses jovens pugilistas, a maioria deles retirados de situações delicadas na sociedade, desde jovens em situação de vulnerabilidade social até com problemas de personalidade. Hoje, esses atletas treinam gratuitamente na escola. 

“Temos diversas promessas do boxe aqui. Um deles, por exemplo, tinha uma bagagem muito pesada lá fora. Viemos construindo e reconstruindo os valores, os princípios na vida deles e, daqui a pouco, acredito que vamos ter sim verdadeiros campeões, de nível nacional e, quem sabe, internacional. Com certeza vamos ver esses meninos em uma Olimpíada, tenho fé nisso”, pondera o treinador Mano. 

Dentre esses atletas está Gabriel Ribeiro Leitão, de 17 anos, que é filho do técnico Mano, e que pratica a modalidade desde os sete anos de idade. “Tenho muito orgulho de dizer o meu próprio treinador é meu pai. Quando era criança apanhei muito, a ponto de cair no chão, mas no decorrer fui criando experiência e aprimorando minhas técnicas. E desde pequeno eu falava para a minha mãe que queria ser um lutador profissional. Creio que nada é impossível. Tenho fé que talvez um dia eu vou estar nas Olimpíadas, olhar para a televisão e falar: ‘é nóis Brasil”, comenta Gabriel, com um largo sorriso no rosto. 

Gabriel seguiu os passos do pai e também pratica o boxe com o objetivo de chegar ao nível profissional / Foto: Kévin Sganzerla

Boxe para o público em geral

A partir dos 12 anos de idade, a Mano Boxe oportuniza a prática do boxe olímpico para a comunidade de Bento Gonçalves. Os treinamentos, por vezes, são integrados aos trabalhos com os atletas de alto-rendimento, desta forma, facilitando a adaptação e o compartilhamento de experiências entre aqueles que já contam com uma bagagem no boxe e com os que estão ingressando, seja por diversão, saúde ou com o intuito de se tornar um atleta. 

A escola fornece o trabalho de exercício físico, alongamento e parte técnica do boxe. “Os nossos atletas treinam geralmente em horários diferentes, mas hoje, por conta da pandemia, conseguimos colocar eles juntos com o público em geral também. Desta forma, os atletas acabam nos ajudando nos treinamentos para auxiliar aqueles que estão aprendendo as técnicas”, explica o treinador. 

As mulheres também se fazem presentes na modalidade, tanto apenas para treinamento como a nível de competição. Assim como os jovens e promissores atletas que estão sendo formados, o boxe também fez a diferença na vida de diversas pessoas que praticam a modalidade sem o objetivo de competir. 

Renata pratica a modalidade desde 2019 / Foto: Arquivo pessoal

É o caso de Renata Basso, que ingressou no boxe em 2019. “Foi algo despretensioso. Eu sempre pratiquei atividades físicas e estava há alguns anos fazendo treinamento funcional. Porém, não estava mais animada como quando comecei, então, por indicação, conheci o boxe e nunca mais parei”, relata. 

O ambiente acolhedor fez Renata se apaixonar pelo boxe logo na primeira aula. O interesse pela modalidade ganhou tamanho apreço que ela começou a pesquisar sobre o esporte. “Lembro da minha primeira aula, quando o Mano me recebeu na escola. Nesse momento já gostei do ambiente, das pessoas, da felicidade que mora ali, e aí a paixão começou. Em seis meses perdi 7 Kg. Não era um objetivo, mas confesso que foi ótimo. Comecei a ler sobre Boxe, conhecer a história da nobre arte, então a paixão virou amor”, comenta Renata. 

Ela comenta que, além da questão da saúde, o boxe oportunizou novas amizades, um vasto conhecimento e lições importantes para a vida. “O boxe faz com que você supere os seus limites corporais e mentais. Quanto mais você pratica, mais você quer. Lembro que cheguei a treinar 3 horas diretas. Posso dizer de boca cheia que alguns dos meus melhores amigos estão nesse lugar. Mas a lição mais importante que aprendi no Boxe foi: a vida não é sobre ganhar sempre, o bonito mesmo é aprender a perder e saber como tirar o melhor de cada situação ruim”, destaca. 

Através do boxe também se constroem sonhos. A exemplo de Alisson, que deixou as drogas e o crime para focar em ser campeão, e dos jovens atletas de alto-rendimento, que almejam competir a nível profissional, outros desejos também surgem por meio da modalidade. 

É o caso do atleta Grégori Duarte, de 32 anos, que pratica a modalidade desde os 25 anos. Ele se espelha no técnico Mano para também se tornar futuramente um mentor. 

“Quando comecei a praticar não tinha finalidade competitiva. Comecei a praticar como um investimento na minha saúde física. Meu objetivo sempre foi entrar no boxe, começar a treinar e nunca mais parar. No momento que comecei a adquirir técnica e preparo físico, comecei a visar um pouco mais as competições. Em função da minha faixa etária, tenho o objetivo de continuar treinando a modalidade enquanto eu estiver vivo, enquanto tiver pulmão e pernas para trabalhar, e também pretendo me tornar um técnico”, comenta Grégori. 

Com o sonho de se tornar um treinador, Grégori já auxilia atletas que ingressam à modalidade / Foto: Kévin Sganzerla

Projeto social:

Aos sábados, a academia atende de forma gratuita crianças a partir dos 7 anos de idade em seu projeto social. “Utilizamos esse projeto para pegar as crianças mais carentes e trabalhar em cima de princípios e valores. Também estamos abrindo as portas para todos os tipos de classe, para aquela família que tem condição de pagar e quer ver o seu filho praticando o boxe. Temos crianças de todas as realidades da nossa cidade”, explica Mano. 

No projeto social, a escola de boxe trabalha, sobretudo, na pratica de valores como respeito, empatia e união, não só por meio dos treinamentos, mas também por outras atividades como organização do ambiente, gentilezas, por mais simples que sejam, e educação. A Mano Boxe também oferece lanche da manhã nos intervalos dos treinos. As atividades do projeto Mano Boxe ocorrem aos sábados, pela manhã, das 8h30 às 10h30. 

Para fazer parte da escola Mano Boxe e conhecer a modalidade, basta entrar em contato pelo fone (54) 99919-5619 com Mano, ou comparecer na sede, que está localizada na Rua Passo Fundo, 161, no bairro Juventude da Enologia - entrada por um portão ao lado da mecânica. 

Confira as demais reportagens da série BENTO OLÍMPICA:

Skate: Sensação nas Olimpíadas, skate luta pela desmarginalização e pela busca por espaços e incentivo

Escalada: O céu é o limite: Leão Gropo fomenta a prática da escalada em Bento e região

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