
A Universidade de Caxias do Sul (UCS) decidiu devolver à Prefeitura de Bento Gonçalves o acervo do Memorial Ernesto Geisel, após a exposição tornar-se alvo de questionamentos públicos e de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF). A decisão foi comunicada em nota oficial assinada na sexta-feira (19).
O memorial estava instalado desde 19 de novembro na biblioteca do campus da UCS em Bento Gonçalves. Três dias depois, em 22 de novembro, o MPF recomendou formalmente que a universidade desativasse a exposição. Como o pedido não foi atendido, o órgão ingressou com ação judicial na última semana.
Para o MPF, a manutenção do memorial configurava violação aos direitos à memória e à verdade, além de representar uma afronta à dignidade das vítimas da ditadura militar. O órgão sustenta que Ernesto Geisel, presidente do Brasil entre 1974 e 1979, é apontado no Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV) como um dos responsáveis por graves violações de direitos humanos.
Segundo o MPF, durante o governo Geisel, a política de desaparecimentos forçados foi sistemática, fato que resultou em condenações do Estado brasileiro pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Diante desse histórico, o órgão considerou a existência do memorial “incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro”.
Na nota, a UCS afirma que o acervo não possui caráter celebrativo, nem elementos de exaltação pessoal ao ex-presidente. “A temática do acervo não possui elogios, discursos celebrativos ou elementos de promoção ou culto à personalidade do ex-presidente”, diz o comunicado.
A universidade explica que o material vinha sendo preservado pela comunidade de Bento Gonçalves e estava instalado desde 2019 na Casa Geisel, antiga residência do ex-presidente. A transferência para a UCS ocorreu devido à deterioração do imóvel, a pedido dos responsáveis pelo acervo.
“A figura de Ernesto Geisel aparece apenas como referência temporal e institucional da Presidência da República, nos limites para explicar o contexto histórico”, sustenta a instituição.
A universidade também destacou que o pedido de medida liminar apresentado pelo MPF para a desativação imediata do memorial foi indeferido pela Justiça Federal. A decisão foi assinada pelo juiz Bruno Risch Fagundes de Oliveira, no dia 17 de dezembro de 2025.
Ainda assim, a UCS optou pela devolução do acervo. “Informamos à comunidade que o acervo foi removido das dependências universitárias e entregue aos cuidados da Prefeitura Municipal de Bento Gonçalves”, afirma a nota, na qual a universidade reafirma seu “compromisso com a pluralidade”, marca de seus 58 anos de história.
A Prefeitura de Bento Gonçalves informou, por meio de nota, que o material devolvido pela UCS está armazenado pelo município. O Executivo municipal classificou o acervo como “material histórico, de um cidadão nascido em Bento Gonçalves, que se tornou presidente do Brasil”.
Até o momento, não há informações oficiais sobre novo local de exposição ou sobre o destino definitivo do acervo.
O episódio reacende o debate sobre a preservação da memória histórica e os limites entre contextualização e possível exaltação de personagens ligados ao regime militar. Para o MPF, a forma como o memorial foi apresentado feria princípios democráticos. Para a UCS, tratava-se de um acervo de caráter histórico e educativo, sem viés apologético.
Com a devolução do material à prefeitura, a discussão passa agora ao âmbito municipal, enquanto a polêmica evidencia as tensões ainda presentes na sociedade brasileira em torno da herança da ditadura militar e do direito à memória e à verdade.
"O acervo do Memorial Ernesto Geisel, preservado pela comunidade de Bento Gonçalves, instalado na Casa Geisel no ano de 2019, antiga residência do ex-presidente, precisou ser relocalizado devido à deterioração do local. Por esse motivo, a pedido, a UCS o acolheu na biblioteca do Campus Universitário de Bento Gonçalves.
A temática do acervo não possui elogios, discursos celebrativos ou elementos de promoção ou culto à personalidade do ex-presidente. A figura de Ernesto Geisel aparece apenas como referência temporal e institucional da Presidência da República, nos limites para explicar o contexto histórico.
O pedido de medida liminar ajuizado pelo Ministério Público Federal visando à desativação imediata do memorial foi indeferido, conforme despacho assinado pelo juiz Bruno Risch Fagundes de Oliveira no dia 17/12/2025.
De qualquer forma, informamos à comunidade que o acervo foi removido das dependências universitárias e entregue aos cuidados da Prefeitura Municipal de Bento Gonçalves. A UCS reafirma seu compromisso com a pluralidade que marca sua trajetória de 58 anos de história".