Mesmo com exemplos de países que se tornaram grandes centros de disseminação do Coronavírus do final de 2019 para cá, como China, Itália e Estados Unidos, o Brasil ainda não tem certeza do que está por enfrentar ao longo dos próximos meses. Essas dúvidas, inevitalmente, recaem sobre os estados e municípios, que, embora possam compartilhar algumas medidas mitigatórias em comum, têm experimentado impactos diferentes junto às suas populações, algumas delas já em meio a uma situação de descontrole com relação à propagação deste inimigo invisível.

Oficialmente, Bento Gonçalves ultrapassou nesta semana a marca de 50 infectados, mas ainda não registrou nenhum óbito entre seus moradores. Contudo, uma projeção incluída no Plano de Contingência elaborado pela Secretaria de Saúde – e datado de 21 de abril – apresenta cinco cenários possíveis para o período compreendido entre agora e o final de agosto: no mais dramático deles, caso não houvesse nenhum tipo de medida mitigatória, mais de 106 mil habitantes seriam contaminados e ao menos 653 morreriam. Antes disso, 866 necessitariam de UTI, ou seja, muito além do suportável para a cidade. Nos outros quatro cenários, os índices reduzem conforme aumenta a intensidade das ações preventivas (confira o quadro abaixo).

Antecipação
Os trabalhos para controle da pandemia de Coronavírus iniciaram em Bento ainda no final de janeiro. Naquele momento, os setores de Epidemiologia da prefeitura e de Infectologia do Hospital Tacchini compuseram um gabinete de verificação a respeito da propagação do Covid-19. Um mês depois, nos últimos dias de fevereiro, foi criado o comitê municipal que seria o responsável, entre outras ações, pela divulgação oficial dos dados relacionados ao contágio. No decorrer destes dois meses, o grupo apresentou boletins diários com as informações sobre casos confirmados e suspeitos.

Mais do que apenas contabilizar pacientes efetivos e potenciais, a rede local tratou de ganhar tempo e montar uma estrutura de saúde com condições de suportar um momento mais crítico desta nova realidade, que ainda pode estar por chegar. O objetivo é claro: tentar justamente evitar que o número de internados em situação mais delicada, sobretudo na terapia intensiva, seja maior do que a capacidade de atendimento.

A isso, somaram-se várias determinações restritivas decretadas pela prefeitura e pelo governo gaúcho, algumas delas já afrouxadas nas últimas semanas, com a retomada parcial de atividades industriais e comerciais. A partir do dia 1º, como já noticiado pelo NB, a resistência ao uso de máscaras poderá resultar em multas para os cidadãos.

Avanço na estrutura
Nesta segunda-feira, dia 27, foram entregues os 40 novos leitos construídos em tempo recorde junto à UPA 24h, no bairro Botafogo. O projeto contou com doações da comunidade e o envolvimento de muitos voluntários, e funcionará como uma retaguarda às vagas disponibilizadas pelo Hospital Tacchini. Havendo necessidade, eles podem ter sua lotação até duplicada no futuro.

A própria UPA já conta com mais oito leitos de isolamento consideradas "mini UTIs". Todos possuem respirador, monitor, equipe treinada e intensivista, que estabilizam os pacientes mais graves antes de serem transferidos ao Tacchini.

No Hospital, um andar inteiro, com 40 leitos, está reservado para internação de infectados pelo Coronavírus. Inicialmente, assim como a nova ala da UPA, eles serão ocupados de forma individual, mas podem ser formatados para otimizar o espaço.

A UTI do Tacchini, por sua vez, foi ampliada de 26 para 30 vagas, sendo 14 SUS e 16 particulares. "A gente tem intenção de utilizar mais alguns destes leitos também como SUS", adianta o secretário de Saúde, Diogo Segabinazzi Siqueira.

Ainda no Tacchini, a instituição já dispunha de 40 respiradores e, com mais 15 alugados ou comprados, agora tem 55 destes equipamentos. Na UPA, eram cinco, dois deles de última geração adquiridos no ano passado. Outros cinco mais antigos foram reformados, e mais dez alugados. Assim, no total, são 75 respiradores, cuja capacidade pode ser até triplicada graças a válvulas desenvolvidas para o uso compartilhado dos aparelhos.

Tanto UPA como Tacchini também ganharam ambulatórios de campanha, que prestam atendimento prévio a pacientes com sintomas, o chamado "fast track". Os postos temporários foram instalados em frente à unidade e ao pronto-socorro.

Outras ações
Uma série de outras iniciativas tem sido conduzidas na cidade desde fevereiro e com mais força em abril, a fim de frear a disseminação do Coronavíruas. Entre elas, destacam-se barreiras sanitárias, sanitização de ruas, monitoramento da temperatura de pessoas em via pública, produção e distribuição de máscaras e de sabão e o monitoramento de pacientes por bairro, com o emprego, inclusive, de ferramentas de georreferenciamento – são elas que apontam que comunidades como São Roque, Santa Helena e Ouro Verde despontam em números de pessoas com sintomas que podem estar relacionados ao contágio por Covid-19.

PROJEÇÃO DE CASOS DE COVID-19 ENTRE ABRIL E AGOSTO EM BENTO GONÇALVES:

Para entender a projeção acima:
– Sem mitigação (inação): não promover nenhuma ação para prevenir o contágio e proteger a população.
– Mitigação (distanciamento social): aceitar que não se pode deter o Coronavírus e, portanto, diminuir sua propagação e tratar de evitar ao máximo casos de contágio que fariam colapsar o sistema público de saúde.
– Supressão: romper as cadeias de transmissão, tratando de efetivamente de deter a epidemia e reduzir os casos ao menor número possível.