
O Ministério Público do Rio Grande do Sul, por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO/MPRS), deflagrou nesta quinta-feira, 4 de dezembro, a Operação Ascaris, que apura o desvio e a comercialização ilegal de doações enviadas dos Estados Unidos e de empresas da Serra Gaúcha destinadas às vítimas das enchentes de 2024. O caso atinge diretamente três municípios: Caxias do Sul, São Marcos e Boa Vista do Sul.
Ao todo, foram cumpridos oito mandados de busca e apreensão, além do bloqueio de contas bancárias no valor de R$ 2 milhões. O objetivo é interromper o fluxo financeiro originado da venda irregular dos donativos e aprofundar as investigações sobre o alcance da fraude.
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A investigação, conduzida pelo promotor de Justiça Manoel Figueiredo Antunes, revelou que roupas e utensílios enviados para auxiliar famílias desabrigadas foram encaminhados inicialmente a uma ONG da região. Porém, em vez de chegar às vítimas, parte dessas doações foi revendida em brechós, com indícios de enriquecimento ilícito da organização criminosa.
Segundo o GAECO, o esquema envolvia:
Uso de laranjas para movimentação financeira;
Recebimento de valores via Pix em nome de terceiros;
Compra de veículos, apartamento e outros bens com o dinheiro das vendas ilegais;
Divulgação de ações solidárias falsas para fortalecer a credibilidade pública dos envolvidos.
Oito pessoas — três delas da mesma família — e uma pessoa jurídica são investigadas.
A operação teve início após uma denúncia feita ao Consulado-Geral do Brasil em Miami, alertando as autoridades sobre a venda de roupas importadas, algumas de marcas conhecidas, que deveriam ter sido destinadas às famílias afetadas pelas chuvas. A Defesa Civil do Estado, ao receber o relato, acionou o Ministério Público.
Agora, com a apreensão de documentos, celulares e mídias digitais, o objetivo é identificar:
O total movimentado pelo grupo;
Se houve desvio de doações em outras situações;
Todos os envolvidos no esquema;
Como se deu a lavagem de dinheiro durante a calamidade.
Para o promotor Manoel Figueiredo Antunes, o caso representa uma grave violação da confiança pública:
“O interesse público é muito superior ao interesse individual dos investigados, que se aproveitaram da dor das pessoas para obter vantagem patrimonial. Inclusive, divulgavam ações solidárias nas redes sociais durante as enchentes, e um dos investigados chegou a ser reconhecido publicamente por isso.”
O coordenador estadual do GAECO, promotor André Dal Molin, reforçou que o propósito da operação é duplo:
“A Operação Ascaris busca responsabilizar os envolvidos e garantir a recuperação dos recursos e bens desviados.”
De acordo com o Ministério Público, os suspeitos podem responder pelos crimes de:
Apropriação indébita
Organização criminosa
Lavagem de dinheiro
Todos cometidos em contexto de calamidade pública, circunstância que agrava as penalidades.
Entre moradores das cidades atingidas, a investigação reforça sentimentos de revolta e injustiça. As enchentes de 2024 deixaram milhares de pessoas desabrigadas, e grande parte do socorro emergencial dependeu de redes de solidariedade formadas no Brasil e no exterior.
A Operação Ascaris agora avança para identificar todo o caminho percorrido pelos donativos desviados e responsabilizar os envolvidos em um esquema que, segundo o MP, transformou a tragédia alheia em oportunidade de lucro.