Geral Cidadãos invisíveis
O poder da união: vizinhos ajudam idosa a cuidar de filho acamado
Risonho e “falante”, morador de Bento, que sofreu sequelas severas por conta de um acidente, conta com o amor incondicional e o esforço de sua mãe que, por sua vez, tem o apoio de vizinhos para enfrentar os desafios.
26/04/2023 23h54 Atualizada há 2 anos
Por: Kevin Sganzerla Fonte: NB Notícias
Foto: Kévin Sganzerla

Segurar os prantos ao falar do apoio do ser humano para consigo é uma tarefa quase difícil para Lourdes Maria de Carli, moradora do bairro Borgo. Desde 2016 ela teve a sua vida transformada após seu filho, Vanderlei Roman, de 50 anos, ter sofrido um grave acidente em Orlando, nos Estados Unidos, que o deixou com sequelas irreversíveis. Mesmo com o peso da idade, a mãe encarou o desafio de aprender a cuidá-lo, e tudo se tornou mais fácil com o apoio da comunidade ao seu redor.

No dia 22 de novembro de 2015, Vanderlei trafegava de moto pela famosa International Drive, em Orlando, nos Estados Unidos, onde morava há 11 anos, quando foi fechado por um carro, sofrendo uma queda violenta que resultou em traumatismo craniano grave. Ele passou por diversas cirurgias e ficou em coma durante 20 dias.

“A mulher que estava junto com ele ligou e ficamos apavorados. Só que ir para lá não tínhamos condições. O único contato era com ela. Os médicos estavam querendo desligar os aparelhos, mas quando eles deram o ok para ela assinar o papel para desligar, ela conversou com a gente. Eu falei para ela que não estava lá para ver, e que era para ela decidir. Quando restavam dois dias do prazo para ela assinar, ele deu um sinal de vida, abrindo o olho e mexendo a mão, mas os médicos não acreditaram nela”, detalha Lourdes.

No entanto, Vanderlei reagiu novamente na presença de uma enfermeira e, então, passou por procedimentos que o fizeram evoluir. Por meio do SUS e da Cruz Vermelha, ele retornou para Bento Gonçalves em 2016, porém foi direto para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Tacchini, uma vez que, por conta da pressão do avião, a sua cabeça aumentou significativamente de tamanho.

Continua após a publicidade

Ele se salvou da morte, porém teve sequelas irreversíveis. Vanderlei perdeu os movimentos da metade esquerda do seu corpo e não conseguiu mais falar, apenas emitir sons que são pouco compreensíveis. Lourdes, então, passou a dirigir suas energias exclusivamente aos cuidados do seu filho, ao passo em que cuidava de seu neto, que também mora junto com ambos.

“Não sabia lidar com um acamado. Quando ele veio para casa só se alimentava por meio de sonda e tinha a cânula de traqueostomia. Fui atrás de uma cama hospitalar e, depois, ele ganhou essa que usa agora. Tive que aprender a lidar com ele. Sabe que a mãe para o filho faz tudo. Eram muitos os cuidados, com a alimentação, com a higiene, que era dobrada e muito difícil”, explica.

Lourdes relata que o pouco que ganhava foi gasto com fraldas, remédios e demais mantimentos essenciais para cuidá-lo. Atualmente, ela conta com o apoio do SUS, com assistência médica mensal, medicamentos gratuitos e doação de fraldas por parte do poder público, que a auxilia de forma significativa.

Continua após a publicidade

Porém, acima de tudo, o apoio da comunidade, desde vizinhos, amigos, tanto de Lourdes como do Vanderlei, e pessoas solidárias a ajudaram a encarar cada dia deste desafio de assisti-lo com todos os cuidados, mesmo com as limitações por conta de sua idade.

Para abordar sobre a solidariedade de quem a ajuda no dia-a-dia, Lourdes não contém as lágrimas. “Eu tenho muita ajuda das pessoas. Tenho que agradecer muito essas pessoas, é muita gente, todos dias vem gente me ajudar, vizinhos, amigos, parentes. A ajuda que ele tem é muito grande, da mesma forma com meu netinho. Os pais não se importam com ele e tenho que tomar conta, é tudo comigo. Muitas vezes perdia as forças e chamava os vizinhos que vinham correndo me ajudar”, comenta emocionada.

O irmão de Vanderlei, conforme Lourdes, não auxilia dentro de casa e pouco se importa com o seu filho, Samuel, que mora com ela. Inicialmente, a irmã de Lourdes a auxiliava, porém, após um problema de saúde, agora a ajuda fazendo companhia quando a mãe necessita sair de casa para fazer compras ou para outros compromissos. “Primeiro faço as coisas para ele, depois para o neto, depois eu, e eu fico por último”, ressalta Lourdes.

A mãe transparece um largo sorriso no rosto quando comenta que Vanderlei recebe muitas visitas durante a semana, o que o deixa significativamente contente. Prova disso é a vontade de conversar e de rir com a companhia que está com ele.

“Nos finais de semana vem um, vem outro, os vizinhos me ajudam muito, vem todos os dias, gritam do portão se preciso de alguma coisa. Eles vêm com a bacia de carne, alimentos. E visita sempre tem, os amigos dele, minhas amigas. Ele era uma pessoa de fazer muita amizade e sempre ajudava as pessoas. Eu também tinha esse coração. O que ajudei agora estou tendo retorno. Agradeço todas as noites por isso”, destaca a mãe com feição demonstrando muita emoção.

A família é uma das mais de 8.800 de Bento Gonçalves cadastradas no CadÚnico e que se encaixam em situação de pobreza ou extrema-pobreza. As circunstâncias, no entanto, demonstram que não falta esforço por parte de Lourdes para dar a melhor assistência possível ao seu filho e ao seu netinho. Sobretudo, o apoio da comunidade que rodeia a família oferece as forças necessárias para que a mãe siga se orgulhando de tê-los por perto e, principalmente, demonstra que ela não está sozinha neste desafio.