Em audiência pública sobre a emissão direta de títulos públicos, deputados da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados questionaram o volume da dívida pública e a necessidade de manter reservas internacionais que consideram excessivas em um cenário de aumento da taxa de juros.
O deputado Mauro Benevides Filho (PDT-CE) lamentou especialmente a falta de limites para despesas financeiras, que não passam pelo controle do Congresso Nacional. "Hoje, o Congresso Nacional não diz nada sobre despesa financeira. O Orçamento da União é de R$ 4,8 trilhões, sendo que somente R$ 1,8 trilhão é despesa primária, o que nós discutimos. Quanto aos outros R$ 3 trilhões, não há a menor indicação de discussão aqui nesta Casa. Para mim, é um absurdo. Juros, amortização, rolagem de dívida e assim por diante. Na despesa primária, o Congresso limita a suplementação do Poder Executivo a 22%. Na despesa financeira, nada."
Maro Benevides Filho estima que o aumento da taxa Selic deve elevar o pagamento de juros neste ano da estimativa inicial de R$ 350 bilhões para quase R$ 680 bilhões. "Sabe qual é o limite disso aí? O céu. O Tesouro federal suplementa isso, não dá satisfação à gente, vai para R$ 700 bilhões e está tudo por isso mesmo. É assim que funciona", criticou.
Reservas
O deputado Gilberto Nascimento (PSC-SP) questionou as reservas internacionais do Brasil, que chegaram a US$ 353 bilhões em março, após uma trajetória de queda desde agosto do ano passado, quando alcançaram US$ 370 bilhões. "Se pegarmos a média do mundo, estamos muito acima. E estamos pegando dinheiro para pagar juros para alguém. E isso vai crescendo, nossa inflação vai aumentando, o nosso povo vai tendo que trabalhar mais, nossas empresas pagando mais impostos. Só que esses impostos infelizmente já não vêm diretamente para atender às necessidades dos mais pobres, o que seria um caminho. Mas o dinheiro vem sendo usado para pagar mais juros e vai sumindo a cada dia", disse.
Mauro Benevides Filho afirmou que, segundo os parâmetros do próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), o volume de reservas internacionais poderia ser reduzido para quase US$ 200 bilhões. Isso reduziria os custos fiscais de manutenção dos títulos em dólar, mas ainda assim manteria a segurança jurídica para investidores e importadores. "Manter a reserva internacional além do limite que manda a teoria econômica é um custo fiscal que não tem precedente", criticou.
Segurança
O deputado Enio Verri (PT-PR) ponderou que as reservas passam segurança ao mercado e já estão em boa parte compromissadas em operações de garantia como fundo de swap. "O risco seria reduzir as reservas e jogar este dólar na economia. A gente destrói a economia se fizer isso. O aumento das reservas cambiais não se dá de uma maneira programada. Tem muito a ver com a relação da economia local com o resto do mundo", declarou.
O consultor do Orçamento da Câmara dos Deputados Antonio d'Ávila Carvalho Júnior afirmou que as reservas internacionais têm provocado o aumento da dívida bruta, mas não da dívida líquida. "Existe um custo fiscal de manter reservas internacionais, que como o deputado falou está em um nível acima do que me parece razoável", reconheceu.
Financiador infinito
Carvalho Júnior alertou que os ganhos cambiais do Banco Central podem ser utilizados para financiar o sistema financeiro federal de maneira indevida. "Como exemplo, ganhos com câmbio do Banco Central podem ser vinculados ao resgate da dívida pública mobiliária da União e depois transformados em dinheiro pelas instituições financeiras federais. Isso pode ser uma ponte para injetar dinheiro de maneira indevida no sistema financeiro federal. Aí você permite que o Banco Central seja um financiador infinito, porque o Banco Central não tem limite para emitir moeda. O Banco Central vai financiar o sistema como bem entender.
O consultor lembrou que, em uma das maiores operações de emissão direta, a Medida Provisória 438/09 chegou a emitir R$ 450 bilhões para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). "Com o diferencial de taxas do contrato da União e dos juros cobrados pela instituição financeira, a operação produzia prejuízo para a União e lucro para o banco. No entanto, a instituição pública paga dividendos para a União. Com isso, esses recursos voltam a ficar disponíveis para a União como receita primária", comentou.
Mauro Benevides Filho alertou que, mesmo com a substituição de fontes, a União sempre teria ônus nessas operações. "O pulo do gato é que a taxa de juros que a União paga vai ser sempre maior do que a acertada na emissão direta."