A adequação de espaços frequentados por crianças nos dias de visitas em unidades penitenciárias é uma das ações desenvolvidas no escopo do Programa Primeira Infância no Contexto Prisional. É com mão de obra de pessoas privadas de liberdade da Penitenciária Modulada Estadual de Montenegro (PMEM), que os brinquedos que equipam essas salas estão sendo confeccionados. Lá, três apenados estão produzindo 450 carrinhos, casas de bonecas, cavalinhos balanços e quadros pedagógicos para equipar as salas de espera.
O programa do governo do Estado é coordenado pela Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo (SSPS), por meio do Departamento de Políticas Penais (DPP) e do Departamento de Tratamento Penal (DTP) da Polícia Penal. A ação tem a participação da Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes), da Secretaria da Saúde e o apoio do Gabinete do Vice-governador.
A atividade na PMEM é uma continuidade de atividades que já vêm sendo executadas para equipar as salas de espera de unidades penitenciárias de regime fechado. No Presídio Estadual Feminino de Lajeado, detentas confeccionaram 140 ursos em amigurumis (figuras de animais e personagens populares confeccionadas de crochê ou tricô, sob técnica artesanal japonesa). Na Penitenciária Estadual de Caxias do Sul (Pecs), apenados fabricaram 100 nichos decorativos de madeira e, na Penitenciária Estadual Modulada de Ijuí, foram feitos moldes para a pintura de calçadas lúdicas.
Proteção da infância
Para o secretário de Sistemas Penal e Socioeducativo, Jorge Pozzobom, a ação na PMEM reafirma o compromisso do Estado com a proteção integral da infância e com uma política penal que reconhece o caráter social, preventivo e transformador da inclusão. “O trabalho prisional e as políticas de humanização no sistema prisional são instrumentos essenciais de ressocialização e promoção da cidadania, pois possibilitam que as pessoas privadas de liberdade deixem o cárcere melhores do que quando entraram, com acesso ao desenvolvimento de habilidades e a novas perspectivas de vida fora do crime”, ressalta.
As iniciativas passaram a ser implementadas depois da realização do estudo “Primeira infância no contexto prisional: crianças de zero a seis anos em famílias do sistema penitenciário do RS”, apresentado pelo governo do Estado, em 2023. A melhoria nas estruturas e nos ambientes de convivência foi um dos itens apontados como necessários para promover a aproximação entre pais e filhos, e viabilizar a manutenção dos vínculos durante o cumprimento de pena. Até o desenvolvimento desta ação, as penitenciárias não contavam com áreas adequadas ao recebimento de crianças.
Direito ao convívio
A diretora do DPP, Bruna Becker, destaca que a convivência de crianças e adolescentes com a mãe ou o pai privado de liberdade é um direito assegurado em lei. “Mais do que isso, as crianças precisam ser prioridade em todos os espaços que frequentam. Nesse sentido, o programa é fundamental, pois orienta e qualifica o olhar para o desenvolvimento integral na primeira infância, promovendo um ambiente mais protetivo e humanizado”, salienta.
Já para Rita Leonardi, diretora do DTP, a busca por qualificação dos espaços é uma meta que está sendo seguida. “A iniciativa prevê a organização e a estruturação de ambientes específicos, considerando a presença do público infantil, com foco na segurança, na redução de impactos do ambiente prisional e no acolhimento adequado durante os dias de visita, em consonância com as diretrizes de proteção integral à criança", descreve.
O trabalho prisional é uma ferramenta de ressocialização que possibilita que as pessoas privadas de liberdade deixem o sistema prisional melhor do que entraram. Contudo, a ação na PMEM, além da ressocialização em si, adquire um novo sentido pelo fato de resgatar a paternidade responsável, já que muitos apenados são pais.
Marcenaria da PMEM
A produção na marcenaria da PMEM não fica restrita a produções pontuais. Bem pelo contrário: é de lá que saem os beliches usados nas 15 instituições de regime semiaberto no Estado. Por mês, a Modulada chega a fabricar 50 camas do tipo. Há, igualmente, pedidos por outros móveis, como armários e estantes.
Vice-diretor da PMEM, Alexandre Chaves, conta que há demandas externas também. “Às vezes, fazemos parcerias com prefeituras. Já produzimos mesinhas e cadeirinhas para uma creche e, na enchente, camas, roupeiros e outros móveis para quem perdeu tudo”, exemplifica.
Um dos apenados responsáveis pela produção dos brinquedos em Montenegro é Joel (nome fictício), que, antes de ingressar no sistema, trabalhava na construção civil. Na PMEM, pediu para trabalhar no setor de manutenção e depois, segundo ele, “se achou na marcenaria”.
“Tenho 3 filhos que não vejo desde que entrei aqui, há cinco anos. Faço como se fosse pra mim e para eles. Não tive muita infância. Comecei a trabalhar com sete anos, porque tinha de ajudar minha mãe. Então eu me sinto bem fazendo os brinquedos, sabendo que as crianças irão aproveitar”, conta Joel.
A madeira para ações como a do Projeto Primeira Infância no Contexto Prisional foi adquirida pela Polícia Penal, mas alguns projetos são executados com insumos doados. “No caso dos móveis fabricados na enchente, recebemos madeira de um sindicato ligado ao setor. Aceitamos doação de equipamentos para a marcenaria, o que pode ser feito por termo de doação. No momento, precisamos de uma furadeira de bancada e de uma serra fita”, acrescenta Chaves.
Trabalho prisional
A PMEM tem 1.820 presos, dos quais 16 trabalham na manutenção, 60 na cozinha e 160, aproximadamente, em cinco pavilhões de trabalho. Atualmente, a penitenciária tem três Termos de Cooperação ativos com empresas. “Para o próximo ano estamos em conversa com um dos empresários para a construção de um pavilhão de trabalho para pelo menos 100 presos”, afirma o diretor da PMEM, Vinicius Assumpção.
No Estado, cerca de 15.600 pessoas privadas de liberdade realizam algum tipo de atividade laboral. Desses, 2.734 de forma remunerada.
O trabalho prisional busca viabilizar a ressocialização, o desenvolvimento de habilidades profissionais e, em parte dos casos, geração de renda aos apenados. Além disso, a cada três dias de trabalho é possível remir um dia da pena privativa de liberdade.
Primeira Infância no Contexto Prisional
O programa é uma iniciativa da SSPS e da Polícia Penal do Rio Grande do Sul, que tem por objetivo assegurar a proteção integral e o pleno desenvolvimento das crianças, com especial atenção àquelas que se encontram na primeira infância e que estão inseridas no contexto prisional em razão do aprisionamento de seus responsáveis ou familiares próximos.
O plano é promover o desenvolvimento saudável dessas crianças por meio da implementação de ações de ambientação adequada e da disponibilização de equipamentos e estruturas apropriadas, garantindo o respeito à dignidade, à condição peculiar de desenvolvimento e aos direitos das crianças que mensalmente visitam seus familiares nos estabelecimentos prisionais.
A ação é desenvolvida de forma intersetorial, envolvendo além da SSPS, a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes), a Secretaria da Saúde (SES) e o Gabinete do Vice-Governador (GVG), atuando prioritariamente em quatro eixos: Proteção às crianças; Apoio à parentalidade responsável; Formação e sensibilização de servidores e agentes públicos; e Articulação de políticas públicas intersetoriais.
Texto: Paula Sória Quedi/Ascom SSPS
Edição: Secom