A aprovação do Projeto de Lei Ordinária 51/2025 pela Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves marca uma mudança significativa na forma como é concedido o Título de Cidadão de Bento Gonçalves. Antes restrito a três homenagens por legislatura (quatro anos), agora será possível entregar até 24 títulos por legislatura ou 6 por ano.
Essa alteração levanta uma questão sensível: a desvalorização de uma das principais honrarias do município. Ao aumentar em oito vezes o número de homenagens, corre-se o risco de transformar o reconhecimento em um gesto corriqueiro, esvaziado de real significado.
Um dos principais pontos de crítica gira em torno da possível instrumentalização do título para fins eleitorais. Será que os vereadores pretendem usar a titulação como moeda de troca ou forma de agradar apoiadores políticos? É uma dúvida legítima, especialmente quando se observa o calendário político e a aproximação de novas eleições.
O único voto contrário ao projeto veio do vereador Alcindo Gabrielli (MDB), que alertou para a possibilidade de banalização da homenagem. Segundo ele, há risco de o título ser concedido mais por conveniência política do que por mérito real.
A nova redação da lei permite também que estrangeiros sejam homenageados com o Título de Cidadão de Bento Gonçalves, o que amplia o alcance da honraria. Em tese, a medida reconhece contribuições vindas de fora do país que beneficiem a cidade, o que, de certa forma, é muito válido. Mas a mudança levanta suspeitas. Estaria o presidente da Câmara, Anderson Zanella (Progressistas), articulando essa alteração para homenagear o cônsul-geral da Itália em Porto Alegre, Valerio Caruso, por exemplo? A pergunta se impõe diante da pressa e do momento político em que o projeto foi aprovado, justo no ano de comemoração dos 150 anos da Imigração Italiana no Brasil.
O processo lembra o que já ocorre na denominação de ruas em Bento Gonçalves. Hoje, não é necessário ter prestado qualquer serviço relevante ao município para receber uma homenagem toponímica. A falta de critérios claros transformou esse reconhecimento em um ato burocrático e, muitas vezes, político. A ampliação indiscriminada de homenagens ameaça fazer o mesmo com o Título de Cidadão, reduzindo sua importância simbólica e histórica.
O que deveria ser um ato solene e raro — homenagear quem verdadeiramente contribuiu para o desenvolvimento de Bento Gonçalves — corre o risco de virar rotina. A cidade já contou com homenageados notáveis, pessoas que deixaram legado concreto. Se não houver critérios rigorosos e transparência, essa história pode ser apagada pela pressa e pela conveniência.
A sociedade civil de Bento Gonçalves precisa estar atenta. Não basta ter regras no papel — é preciso que haja ética, critério e respeito pelas tradições que realmente valorizam quem fez por merecer tal honraria.